Um Olhar Psicológico Para A Paixão, Carinho E Amor.

Quantas vezes você já parou e refletiu sobre seus próprios sentimentos, suas motivações e sobre o que te faz sentir ligado aos outros? Provavelmente não muitas vezes, não é? Talvez porque seja mais fácil pensar sobre os outros do que em si mesmo. Mas será que podemos pensar claramente sobre o mundo que nos rodeia, sem estarmos em paz com nosso mundo interno? (digo paz, e não necessariamente organizados, nem sempre vamos estar tão organizados, mas isso é um outro assunto).

Então antes de entender os motivos dos outros, é preciso a compreensão sobre nossas próprias motivações e como elas podem ganhar diferentes proporções durante o tempo. Por isso achei digno escrever sobre os sentimentos que a grande maioria já sentiu o que deseja sentir, e principalmente, ser alvo desse sentimento. O amor!

O desejo de amar e ser amado, para muitos é uma enorme motivação. Mas o que poucas vezes se diz, é que é preciso estar motivado para amar e que esse amar é fruto de um trabalho. Portanto, a paixão neste caso pode ser vista como uma motivação para o amor, mas tanto para experienciar o amor plenamente, quanto para aborda-lo de de forma não puramente poética é preciso algum esforço.

Sim, o amor dá trabalho! Pois não é algo que simplesmente surge sem explicação, mas sim um sentimento que resulta de várias outras interações de componentes que as vezes precisam ser construídas. Esse é o verdadeiro trabalho!

Faz algum tempo que penso sobre isso de forma mais metódica, em especial após ler um artigo chamado “A Teoria Triangular do Amor”, escrita por Sternberg. Na época, mais romântico, não percebi de fato a real profundidade da questão, mas hoje ela me parece muito mais palpável do que antes. Talvez minha mente esteja mais calma para refletir sobre essa questão, somente depois desse tempo, ou que algumas coisas realmente só se deem com o tempo. Talvez as duas coisas! Então pra falar sobre amor sem proclamar o apostolo Paulo ou poeta Camões, vou me apoiar nessa teoria.

De um ponto de vista técnico, o amor pode ser classificado em três componentes principais: Intimidade, paixão e compromisso. Pensar assim vai nos ajudar a ver esse as raízes desse sentimento, já que na maioria fica fora do nosso Campo de visão, já que cada um desses elementos acaba por manifestar aspectos diferentes do amor.

Começando pela Intimidade, que nessa visão é um dos componentes mais valiosos. E é representada por àqueles sentimentos que promovem proximidade, vínculo e conexão nos relacionamentos amorosos. E pode ser percebido em elementos como o desejo de promover o bem-estar de outra pessoa; a felicidade de poder compartilhar experiências de vida; o discernimento de respeito mútuo; a compreensão mútua de se manter presente nos momentos difíceis da vida do parceiro; a concepção íntima de compartilhar a vida, assim como bens materiais; a disposição de dar e receber apoio emocional; a capacidade de se comunicar além dos níveis superficiais ou práticos; e o reconhecimento mútuo do valor do parceiro em sua vida.

A paixão por sua vez é o componente que se refere às movimentações que conduzem ao romance, à atração física, à relação sexual e aos fenômenos relacionados ao amor propriamente dito. Dos três elementos, é o mais fácil de ser reconhecido, mas isso não significa que seja o mais fácil de definir ou controlar. Embora a paixão seja uma sensação física, a atividade sexual preenche muitas necessidades emocionais. Portanto, este componente pode ser descrito como: sensações românticas; atração física e desejo de estar junto; satisfação e contentamento sexual mútuos; e excitação física e emocional.

Por fim o compromisso, num aspecto mais restrito, é uma decisão por amar o outro, e num aspecto mais abrangente, o compromisso desse alguém para manter este amor. O comprometimento é essencial para um relacionamento duradouro e isto inclui: a certeza de que o que se sente é um tipo especial de amor; a disposição para simbolizar ou articular esse amor de algum modo; a compreensão de que o relacionamento é mais do que um capricho passageiro; e a decisão de investir no relacionamento por um determinado período de tempo.

Esses são os três componentes do amor, e embora possam ser vistos como isolados como descrevi, interagem entre si, podendo fazer que esses se desenvolvam. Por exemplo, uma grande intimidade pode levar a uma grande paixão ou compromisso, assim como o compromisso pode levar a uma grande intimidade ou, com pouca probabilidade, a uma grande paixão.

Agora que temos de forma mais clara esses componentes, vem a parte mais difícil, mas também a mais prazerosa. Pensar sobre cada tipo de relação, e o que o desencadeia nelas os diferentes tipos de amor que sentimos. Ou seja, o resultado das combinações dos componentes intimidade, paixão e compromisso, onde diferentes tipos de amor podem ser gerados.

Deste modo, os três elementos geram sete possíveis tipos de amor quando estas combinações ocorrem:

  1. Carinho: surge quando uma pessoa experimenta somente o componente intimidade, havendo ausência dos componentes paixão e compromisso. O carinho surge com o tempo, seu componente é relativamente fácil portanto abrange um grande número de pessoas.
  2. Amor apaixonado: resulta da vivência do componente paixão e a ausência dos demais. No geral não precisa ser realizado, não existe compromisso e nem contato com a pessoa. Aqui existe uma tendência a idealizações.
  3. Amor vazio: emana da determinação de um dos indivíduos de estar compromissado com o outro, mas há ausência dos componentes de intimidade e paixão. Não existe uma atração física, nem laços de proximidade, mas sim um contrato que determina a necessidade dessa relação.
  4. Amor companheiro (companheirismo): deriva da combinação dos componentes de intimidade e compromisso. No geral são laços familiares mais estreitos e relacionamento de melhores amigos. Nessas relações fica fora qualquer atração física.
  5. Amor ilusório (irreal, insensato): resulta da combinação dos componentes de paixão e compromisso e ausência do componente intimidade. Quando você é tomado por uma paixão e está totalmente comprometido com ela. É aquela paixão avassaladora dos filmes, começa com tudo, mas tente a ser fugaz, já entra em conflito quando elementos da intimidade começam a aparecer (a idealização é confrontada com os dados da realidade).
  6. Amor romântico: fruto do acordo entre os elementos paixão e intimidade, com a falta do compromisso. Geralmente, surge da relação de pessoas que já possuem alguma intimidade e descobrem uma atração sexual. Existe um grande fator de carinho, mas no geral fuga do compromisso, nesse tipo de relação se quer é permitido usar a palavra amor.
  7. Amor completo (realizado): é o resultado da combinação plena dos três componentes do amor. Esse é o tipo mais raro, exatamente por ser o mais trabalhoso, existem vários caminhos para se chegada até ele, mas depende muito de como cada um vai lidar com o amor do outro. Portanto para esse último, o fator principal é o tempo e como os componentes da intimidade, paixão e compromisso vão resistir e entrar em harmonia.

Você percebeu que a soma dos componentes gera tipos de amores bem diferentes, mas sempre maiores do que os elementos separados? Notou que as mais harmônicas são as mais estáveis e compreensivas?

O amor à primeira vista nesse ponto de vista não existe, pelo menos não como amor pleno, ainda é paixão, já que ainda não desenvolveu intimidade e nem compromisso. O amor completo é uma questão de tempo, é fruto de trabalho, é preciso desenvolver intimidade que só acontece com o tempo, assim como é preciso fundar um compromisso de realizar até mesmo algumas concessões para estar junto ao outro.

Imagine que a intimidade, a paixão e o compromisso se apoiam uns nos outros, quando um desses componentes é pequeno em relação aos outros fica difícil de encontrar um ponto de equilíbrio. Mas quanto mais equivalente são os elementos, mais fácil e bonita se torna a relação.

Refletindo sobre isso, eu mesmo já identifiquei alguns de meus relacionamentos. E de onde talvez a pessoa ou mesmo eu, tenha tornado mais difícil o equilíbrio. É um exercício e tanto pensar sobre isso, um exercício de autoconhecimento. Convido que façam o exercício de perceber cada um dos vínculos que tem com as pessoas importantes na sua vida.

Contudo existem situações que pensar ou mesmo sentir se torna mais difícil, já que com o passar do tempo, ou no acontecimento de frustrações desenvolve em nos um sistema de defesa contra as decepções. Só existe um problema nesse sistema de defesa, ele não sabe diferenciar muito bem potenciais decepções de potenciais felicidades. Barrando a intimidade e até o comprometimento. Para essas situações talvez seja necessário a ajuda profissional, que lhe auxilie a afinar esse sistema de defesa, ou até mesmo questionar se ele precisa mesmo existir. Não tenha medo de se desvendar, se conhecer e reconhecer. Afinal somos com uma cidade em constante construção e demolição. Parar esse ciclo significa morrer psicologicamente.

Ilcemar Oliveira, Psicólogo

CRP: 06/114262

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